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Meu time na terra do Tio Sam
New England Revolution 0 x 3 Cruzeiro - O primeiro jogo do Cabuloso nos EUA

Por Victor S. Torres*

Antes de começar meu relato, tenho que deixar claro que o escrevi em um trabalho em minha faculdade aqui dos EUA. Obviamente o escrevi em inglês e agora o traduzi para o português, mas quero deixar claro que ele tem um "quê" de literatura, que era o objetivo da tarefa.

2010 foi um ano que nunca vou esquecer, especialmente aquele verão em Boston, quando o futebol realmente tomou conta da minha vida. Eu tinha 15 anos e, como qualquer garoto de Massachusetts, dividia meu tempo entre a escola, amigos e, claro, futebol. Mas minha paixão pelo esporte tinha um sabor especial – eu era torcedor do Cruzeiro, um amor herdado da minha mãe, que nasceu na cidade de Curvelo, Minas Gerais, Brasil. Meus pais eram separados e, embora eu morasse com meu velho aqui em Boston, sempre mantive viva a chama do meu clube brasileiro, mesmo vendo minha mãe apenas três a quatro vezes por ano.

Naquela tarde, eu estava no meu quarto, jogando videogame, quando ouvi a porta da frente se abrir e fechar com força – sinal de que meu pai tinha chegado do trabalho. Desci correndo as escadas, mal conseguindo conter minha excitação. Ele sorriu ao me ver, já sabendo o motivo da minha ansiedade. "Pronto para ver seu time, campeão?" ele perguntou, trocando sua roupa de trabalho por uma mais casual.

"Você não faz ideia, pai! Vai ser incrível!" respondi, ajudando-o a procurar sua camiseta menos "formal" para a ocasião. Rapidamente, estávamos ambos prontos, minha camisa do Cruzeiro orgulhosamente vestida, e partimos para Foxborough, onde o Cruzeiro enfrentaria o New England Revolution no icônico Gillette Stadium. Era a chance de ver meu time do coração bem de perto, um sonho para qualquer fã.

O trajeto de carro foi rápido, meu pai e eu conversando sobre as possíveis escalações e o que esperávamos do jogo. Ele sempre apoiou minha paixão pelo futebol, mesmo sendo mais fã de baseball.

 

No caminho até o Gilette Stadium, passando pelo centro de Boston, vimos diverrsos outdoors e cartazes convocando a população da cidade para apoiar os Celtics, que estavam a final da NBA contra o arquirrival Lakers. A série estava empatada em 2 a 2, e naquele mesmo dia aconteceria o jogo 5. Voltando ao futebol e já chegando ao estacionamento do estádio, a atmosfera já era elétrica. Fãs de ambos os times acenavam suas bandeiras e vestiam suas cores com orgulho.

Nós estacionamos e logo avistamos Mr. Brian (ele gostava de ser chamado pelo primeiro nome, e não pelo sobrenome), pai do meu amigo Cody, que já estava com a caçamba de sua caminhonete aberta e o grill a postos. "E aí, garotos! Prontos para um bom jogo?" Mr. Brian nos saudou com seu característico chapéu do New England Revolution e um avental de churrasco. Cody, que era tão louco por futebol quanto eu, já estava distribuindo hambúrgueres e salsichas para quem chegava.

Outros amigos da escola estavam lá, sendo que alguns sequer seguiam futebol de perto, mas não perderiam a chance de um bom churrasco americano e a oportunidade de participar de um evento tão animado. Nos juntamos a eles, falando sobre as últimas partidas, nossas expectativas para o jogo e, claro, aproveitando o delicioso churrasco que Mr. Brian preparava.

Entre risadas e brincadeiras, o aroma dos hambúrgueres grelhados e a visão de camisas do Cruzeiro e do Revolution misturadas criavam um cenário perfeito de um verão esportivo em Massachusetts. Era mais do que apenas um jogo de futebol; era um momento de união, alegria e paixão compartilhada pelo esporte.

Enquanto a brisa de verão soprava suavemente e a tarde dava lugar à noite, meu pai colocou a mão sobre meu ombro, sorrindo ao ver meu entusiasmo. "Vai ser uma grande noite, filho," ele disse, e eu não podia concordar mais. Naquele momento, cercado por amigos e família, com meu time jogando a poucos metros de distância, senti-me parte de algo muito maior do que eu. Era realmente um jogo para lembrar.

Após o churrasco e conversas animadas, nos preparamos para entrar no Gillette Stadium. Junto com meu pai, Mr. Brian, e um grupo de amigos, fizemos nosso caminho para os assentos localizados atrás de um dos gols, uma área próxima à "Row of Honor", um stand onde ficam convidados e homenageados durante os jogos do Patriots.

À medida que nos acomodamos, a atmosfera ao redor vibrava com uma energia palpável. Era notável a presença marcante de torcedores do Cruzeiro, além de fãs de outros clubes brasileiros. A comunidade brasileira em Massachusetts é consideravelmente grande, e parecia que todos tinham se reunido aqui, transformando o estádio em um pequeno pedaço do Brasil. As camisas e bandeiras azuis e brancas tremulavam a multidão, trazendo um sentimento de camaradagem e celebração.

Enquanto os jogadores entravam em campo para o aquecimento, ficamos observando seus movimentos e técnicas, comentando entre nós sobre suas habilidades e a estratégia que o Cruzeiro poderia empregar na partida. O ruído de fundo de conversas em português misturado com inglês era um lembrete da natureza global do futebol e de como ele conecta pessoas de diferentes origens.

Após a entrada oficial dos elencos em campo, os alto-falantes anunciaram o início dos hinos nacionais. Primeiro, o hino dos Estados Unidos ecoou pelo estádio, e eu, junto com meu pai e nossos amigos americanos, colocamos as mãos sobre os corações e cantamos com respeito. Em seguida, foi a vez do hino brasileiro, e eu não hesitei em cantar também, sentindo uma onda de orgulho por minha herança brasileira. Foi um momento poderoso, estar ali, cantando os hinos de ambos os meus países, cercado por pessoas que compartilhavam de um amor comum pelo futebol.

Com os hinos concluídos, a partida estava prestes a começar. A expectativa era palpável enquanto os jogadores tomavam suas posições no campo. O apito inicial soou, e o jogo começou com intensidade. O Cruzeiro, vestindo seus tradicionais uniformes azuis e brancos, iniciou com uma pressão forte, empurrando o New England Revolution para a defensiva desde os primeiros minutos.

O jogo fluiu com o Cruzeiro mostrando superioridade técnica, o que era de se esperar dada a paixão e o nível de jogo que os clubes brasileiros frequentemente exibem. As jogadas eram rápidas, com belos passes e uma coordenação que refletia horas de treinamento e entrosamento. Cada ataque do Cruzeiro levantava a torcida, com gritos de encorajamento e cantos que apenas os fãs brasileiros sabem como fazer.

Estar ali, vendo meu time do coração jogar tão longe de casa, cercado por amigos e família, foi um lembrete do porquê eu amo tanto esse esporte. O futebol não é apenas um jogo; é uma celebração da comunidade, da paixão e, acima de tudo, da união entre culturas. Não importava o resultado da partida; o que importava era o momento e as memórias que estávamos criando juntos.

A partida foi mais emocionante do que eu poderia ter imaginado. Desde o apito inicial, o Cruzeiro dominou completamente o jogo, o que era visível tanto no controle de bola quanto na maneira como pressionavam o New England Revolution. O estádio estava pulsando energia, e cada jogada bem-sucedida do Cruzeiro era celebrada com entusiasmo pela China Azul. 

O primeiro gol veio de um lance em que Wellington Paulista recebeu um passe após jogada de Roger e Thiago Ribeiro e driblou o goleiro, mandando a bola para o fundo da rede e levantando a torcida. Foi um momento de pura alegria, e eu não pude deixar de pular e gritar com meu pai e amigos. O segundo gol já no segundo tempo, veio novamente, com Wellington Paulista divindo a bola com um zagueiro após escanteio cobrado por Roger, colocando o Cruzeiro em uma posição ainda mais confortável no jogo. O gol foi um exemplo de excelente trabalho em equipe e faro de centroavante , e foi incrível ver o nível de jogo que o Cruzeiro estava apresentando.

O terceiro e último gol foi marcado novamente por Welington Paulista, já perto do final do jogo. O atacante recebeu cruzamento de Thiago Ribeiro e, de cabeça, mandou a bola para o fundo das redes dos americanos. Até esse momento, o New England Revolution mal conseguia reagir à superioridade técnica do Cruzeiro, que jogava com confiança e fluidez. A defesa do Revolution parecia incapaz de lidar com os avanços constantes do Cruzeiro, e cada ataque do time brasileiro parecia que poderia resultar em gol.

Ao longo do jogo, a presença forte dos torcedores do Cruzeiro no estádio foi notável. Parecia que estávamos em casa, em Belo Horizonte, não em Foxborough. A comunidade brasileira compareceu em peso, e a atmosfera era de festa, com cânticos e bandeiras colorindo as arquibancadas.

Quando o árbitro apitou o final do jogo, a vitória por 3 a 0 sobre o New England Revolution foi celebrada como se fosse uma final de campeonato. Caminhar para fora do estádio, ainda ouvindo os ecos dos cânticos e conversas animadas sobre os destaques do jogo, foi o encerramento perfeito para uma noite inesquecível. Eu estava agradecido por ter vivido essa experiência com meu pai e amigos, e ainda mais orgulhoso de ser meio brasileiro e torcedor do Cruzeiro. Esse jogo reforçou minha conexão com o futebol, com o Cruzeiro, e com a parte brasileira da minha herança de uma maneira que nunca esquecerei.

A parte triste é que eu havia levado uma câmera digital (ainda não era tão comum ter smartphones) e, infelizmente, perdi as fotos daquele dia.

*Professor de literatura e formado pela Tufts University

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